O governador de Mato Grosso do Sul, Eduardo Riedel, deve enviar, até o fim do ano, projeto de lei para regulamentar a ocupação e a supressão de mata nativa nas propriedades rurais do Pantanal.
Outro compromisso feito com técnicos do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, em reunião intermediada pelo deputado federal Vander Loubet (PT), nesta quinta-feira (10) foi o de emitir um decreto que suspende o desmate no Pantanal até dezembro, e que altere as regras previstas em decreto de 2015, feito por seu antecessor, Reinaldo Azambuja (PSDB).
Participaram da reunião por videoconferência, além de Vander Loubet e Eduardo Riedel, os representantes do Ministério do Meio Ambiente, João Paulo Capobianco, secretário executivo, e André de Lima, secretário Extraordinário de Controle do Desmatamento e Ordenamento Ambiental Territorial.
A reunião foi chamada pelo deputado Vander Loubet e pelo governador Eduardo Riedel com objetivo de abrir canal de diálogo entre o Governo do Estado e o MMA por conta de divergências em torno de uma proposta de resolução do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama) que trata do bioma Pantanal.
Trata-se de uma reação do governo de Mato Grosso do Sul à proposta de resolução 02000.005237/2023-15 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) que pode acarretar na suspensão de todas as autorizações de supressão de vegetação nativa emitidas por Mato Grosso do Sul (MS) e Mato Grosso (MT) no bioma Pantanal desde o final da década passada.
No caso das autorizações de Mato Grosso do Sul, elas estão baseadas em decreto de 2015, do ex-governador Reinaldo Azambuja. O assunto foi noticiado em primeira mão pelo Correio do Estado na quarta-feira (12).
A proposta de resolução levou Eduardo Riedel a procurar Vander Loubet, que agendou a reunião com os representantes do Ministério do Meio Ambiente, comandado por Marina Silva. A justificativa do governo, conforme informou a equipe de Loubet, é de que não houve diálogo com os estados, tampouco foi oportunizado que o governo estadual pudesse contrapor as acusações feitas pelas ONGs sobre os desmates em questão.
O governo de MS também questiona a resolução do Conama por seu teor, por entender que trata-se de uma intervenção indevida, por supostamente violar o próprio Regimento Interno do Conselho.
“Organizamos essa reunião justamente para evitar conflitos e abrir espaço para que o Ministério do Meio Ambiente e o governo do nosso estado possam debater a pauta dessa resolução do Conama. É do nosso total interesse que isso seja resolvido da forma mais transparente e tranquila possível”, defendeu Vander. “A preservação do Pantanal e a exploração sustentável do bioma precisam caminhar juntas e acredito que isso vai ser pactuado entre o Estado e a União”, completou.
A RESOLUÇÃO
De acordo com a minuta que já foi redigida pelo Conama e que depende de aprovação do conselho, a supressão da vegetação nativa do Pantanal ou o uso alternativo do solo do bioma deverão considerar estudos científicos conclusivos que abordem aspectos como diversidade das paisagens e ecossistemas; diversidade das espécies (em particular as ameaçadas de extinção); fitofisionomias e ambientes aquáticos raros; diversidade de solos e fauna associada; regime hídrico e pulsos de inundação; ciclo reprodutivo das espécies; ecossistemas e espécies vegetais importantes para a reprodução de espécies da fauna; ambientes aquáticos importantes para a conectividade das paisagens; e a presença dos povos indígenas, entre outras exigências.
A minuta da resolução do Conama ainda aponta que a inexistência ou a não utilização de estudos atuais e consistentes com esses parâmetros citados, realizados por instituição oficial de pesquisa de renome nacional, devem ser motivos para a suspensão imediata e temporária por parte dos estados de Mato Grosso do Sul e Mato Grosso da vigência de autorizações de supressão de vegetação nativa ou de uso alternativo do solo.
O documento que está sendo preparado pelo Conama é apenas a primeira das medidas que vêm sendo tomadas pelo governo federal para organizar a ocupação do solo do Pantanal, depois que monitoramentos realizados por órgãos oficiais, como o Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul (MPMS), o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), além da organização SOS Pantanal, verificaram uma disparada do desmatamento no bioma de outubro de 2015 para cá, quando o Decreto nº 14.273, do ex-governador Reinaldo Azambuja (PSDB), estabeleceu o que esses órgãos chamaram de “legislação permissiva” para a ocupação do Pantanal.
DECRETO COMPRADO
O decreto foi baseado em um estudo realizado pela Fundação de Estudos Agrários Luiz de Queiroz (Fesalq), fundação ligada à Escola Superior de Estudos Agrários Luiz de Queiroz (Esalq), unidade da Universidade de São Paulo (USP). A fundação, a contrário da escola, vende pareceres. Este que fundamentu o decreto de 2015 custou aproximadamente R$ 94,2 mil, e foi pago pela Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul (Famasul), parte interessada em ampliar o uso das propriedades pantaneiras.
O decreto permite a supressão de 60% da mata nativa não arbórea das propriedades pantaneiras e de 50% da vegetação arbórea, não prevendo regra nenhuma para a proteção dos planaltos da Bacia do Alto Paraguai.
O estudo que baseia o decreto não é reconhecido como oficial nem pela USP nem por sua unidade, a Esalq. Ambas admitiram, em inquérito aberto pelo MPMS, sob recomendação do Ministério do Meio Ambiente, que esse estudo é objeto de um contrato.
A Nota Técnica do Ministério do Meio Ambiente nº 1.520, que determinou a confecção da minuta que deve tornar sem efeito as licenças de desmatamento emitidas pelo Imasul de 2015 para cá, já foi divulgada pelo Correio do Estado em outras reportagens.
“O incremento médio do desmatamento no Pantanal sul-mato-grossense testemunhou um avanço de 37.465 hectares, entre 2009 e 2015, para 48.264 hectares, entre 2016 e 2021 (alta de 28,8%), com o maior valor da série histórica sendo registrado em 2021, quando atingiu 74.765 hectares e representou 90,7% do desmatamento ocorrido no bioma (em 2021, foram desmatados 7.682 hectares no Pantanal situado no estado de Mato Grosso)”, aponta a nota técnica do ministério comandado por Marina Silva, com data de 3 de agosto e à qual o Correio do Estado teve acesso.
“Vale notar que os saltos recentes do ritmo do desmatamento coincidiram com a publicação do Decreto Estadual nº 14.273/2015 e da Estadual nº 11.861/2022, em Mato Grosso do Sul e em Mato Grosso, respectivamente”, complementa o documento assinado pelo coordenador-geral do Departamento de Ordenamento Ambiental Territorial, Bruno Siqueira Abe Saber Miguel, e pelo diretor do Departamento de Políticas de Controle de Desmatamento e queimadas, Raoni Guerra Lucas Rajão.
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