Por quê o brasileiro tem tanta aversão à palavra orçamento? Uma esperança sul-mato-grossense

Bruno Bertotto

Por Bruno Bertotto (*) –

 Enfim entramos no ano de 2023. Ano de posse de muitos novos governos e continuidade de tantos outros. Dentro desse contexto, sem arredar o pé da polarização que dominou o debate das últimas eleições, um assunto dominou muitas discussões: orçamento público.

O destaque dado acima de que o tema foi debatido contaminado pela polarização se deve ao fato notório da aprovação da PEC dos Programas Sociais, aprovada ao final de 2022 com o finto de permitir que o novo Governo Lula pudesse “estourar” o teto de gastos em benefício do aumento de programas de transferência de renda e outras políticas públicas voltadas ao campo social.

A reação foi instantânea. De um lado, parte do país (e do mercado) reagiu negativamente, atribuindo pois a esquerda um péssimo hábito de governança de desrespeito aos orçamentos públicos e das políticas fiscais. Sem razão. A coisa não é bem assim. Governos “de direita”, seja o federal até então liderado por Jair Bolsonaro, ou estaduais e municipais com grande constância também estouram tetos orçamentários e se sujeitam a verdadeiro malabarismo para conseguir arcar com gastos descontrolados.

Isso tudo vem de uma constatação que prescinde coleta de opinião, emana na verdade do fato de que o brasileiro tem aversão à palavra orçamento. Ora, se argumentou em favor da esquerda pelo estouro dos gatos para se arcar com os programas sociais (inegavelmente necessários). Ora, a direita não pode perder de vista a aprovação da PEC “Kamikaze”, em favor do Governo Bolsonaro, às vésperas de período eleitoral, medida nunca antes vista e que se não alterada com aval legislativo poderia até mesmo acarretar em infrações eleitorais, pelo notável abuso do poder econômico. Ou seja, de lado a lado, em determinado momento o brasileiro confortou-se com a subestimação do orçamento.

Não é só no setor público que se extrai tal constatação. O orçamento, em palavras simples, é o planejamento futuro daquilo que o Estado irá arrecadar e o exercício de para onde e como essa arrecadação será destinada. Em clubes de futebol também é assim. E, a exemplo do que vem ocorrendo no setor público, os clubes brasileiros, com clamor e aval das torcidas, constantemente vem gastando mais do que arrecadam, estourando seus orçamentos, para trazer esse ou aquele jogador “acima da média”. Isso tem consequências, no setor público ou no futebol, todavia, o torcedor brasileiro não parece amedrontado com isso, em qualquer dessas searas.

É necessário dizer que o controle do orçamento e a responsabilidade fiscal, sobretudo na esfera federal, deixaram de ser prática de governança na última década. Ao revés disso, o descontrole orçamentário se tornou prática de governança. Exemplos para tanto não faltam, conquanto estas más práticas tiveram seu auge ao ser o fundamento jurídico para o impeachment de Dilma Rousseff em 2016, em virtude das bradadas pedaladas fiscais. Exemplos também ocorreram durante o último governo, não com tamanha consequência, mas a exemplo da PEC que permitiu o aumento dos valores do Auxílio Brasil durante o ano de 2022.

O orçamento público é assunto sério, delicado e deve ser detalhadamente debatido e preparado por gente qualificada. Os exemplos acima se deram na esfera federal, mas as consequências de má elaboração e aplicação de orçamento podem ser vistas em especial em estados e municípios, onde vários deixaram de pagar até mesmo a folha dos servidores ou despesas obrigatórias. A toda evidência, quem não consegue sequer pagar aquilo que é o mínimo existencial da administração menos ainda tem capacidade de investimento. A ausência de investimento público atrai estagnação econômica, baixa geração de empregos, diminui a movimentação econômica e coloca o ente público em um ciclo vicioso.

Há luz no fim desse túnel. Existem entes federados que romperam com a má prática de governança e ainda que isso custe caro do ponto de vista da popularidade conseguiram conduzir com seriedade essa palavra que traz aversão ao brasileiro, o tal do orçamento.

Os limites que o orçamento impõe ao gestor público, em especial ao agente político, parece muito com a realidade de quanto os pais precisam dizer não a um pedido de um filho, quando naquele momento não há dinheiro para um presente ou para uma realização pessoal. Ninguém gosta de dizer não, dificilmente se sai mais popular dessa situação.

Aqui, há de se destacar o nosso Mato Grosso do Sul. Ano pós ano o orçamento do Estado vem sendo fielmente cumprido, com pés nos chãos, viabilizando que se tenha dinheiro em caixa e que o investimento público aconteça, atraindo desenvolvimento para o MS como todo, mas sobretudo para os municípios que são constantemente beneficiados com obras públicas, atração de indústrias e empresas. Um detalhe que se passa despercebido e há de ser destacado é que o Governo Riedel iniciou com dinheiro em caixa para bem tocar e executar as obras previamente contratadas ainda no Governo Azambuja, demonstrando saúde financeira e solidez fiscal.

Ainda de Mato Grosso do Sul, há outra esperança. A escolha de Simone Tebet para o cargo de Ministra do Planejamento e Orçamento e Gestão. Parágrafos acima se ponderou que o orçamento é assunto sério, delicado e que deve ser feito por gente qualificada: Simone reúne esses predicados, com um currículo que não pode ser ignorado. Formada em Direito pela Faculdade Nacional (UFRJ), mestre em Direito do Estado pela PUC/SP, tendo ministrado a inerente área do Direito Administrativo, foi ainda deputada estadual, prefeita, vice-governadora e Senadora da República. Suas sabatinas ao longo de 2022 e seu conhecimento técnico-jurídico demonstram sua aptidão, sem perder de vista ainda o traquejo político.

Tamanha aptidão é replicada junto ao Governo Estadual, onde o cargo foi bem desempenhado de exercício de governança e gestão foi feito por seu cônjuge, Eduardo Rocha, que ocupou a Secretaria de Governo e Gestão Estratégica de MS. E agora conduzirá a Casa Civil.

A nova Ministra assumiu publicamente algumas divergências econômicas em relação a pauta petista. Na mesma ocasião, deixou claro que o orçamento não será uma ilha isolada, mas que será participativo e inclusivo, contemplando a boa gestão pública, sem perder de vista ainda as necessidades sociais. Sua capacidade técnica e o elencado traquejo político permite acreditar-se que poderá somar muito no que se tange a responsabilidade fiscal e a boa elaboração e execução do orçamento público. Com a responsabilidade que o tema exige, apesar da aversão de muitos brasileiros ao tema. É uma esperança.

(*) É advogado, graduado pela Universidade Federal da Grande Dourados. Pós-graduado lato sensu em MBA em Gestão Pública. Atualizado em Processo Civil pela Escola Superior da Magistratura. Milita na advocacia em Dourados e Campo Grande/MS. Associado ao escritório Vinciguera Advogados Associados. Sócio no escritório Bertotto & Neves Advocacia. E-mail: brbertotto@gmail.com

Retirado de https://www.folhadedourados.com.br

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